Realidade brasileira
sobre adoção
A diferença entre o
perfil desejado pelos pais adotantes e as crianças disponíveis para
serem adotadas/Para cada criança pronta para adoção, há seis
pessoas dispostas a acolhê-las na família, mas diferença entre
perfil idealizado e o mundo real é obstáculo à redução da enorme
fila de espera
O tema da adoção
no Brasil é um desafio de enormes dimensões, como comprova a
análise dos dados do Cadastro Nacional de Adoção (CNA) e do
Cadastro Nacional de Crianças e Adolescentes Acolhidos (CNCA),
administrados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Existem hoje
cerca de 5.500 crianças em condições de serem adotadas e quase 30
mil famílias na lista de espera do CNA. O Brasil tem 44 mil crianças
e adolescentes atualmente vivendo em abrigos, segundo o CNCA — em
fevereiro do ano passado, eram 37 mil. Se há tantas pessoas
dispostas a acolher uma criança sem família, por que o número de
meninas e meninos do cadastro não para de crescer?
Na avaliação do
próprio CNJ, a resposta pode estar na discrepância que existe entre
o perfil da maioria das crianças do cadastro e o perfil de filho, ou
filha, imaginado pelos que aguardam na fila da adoção.
“Nacionalmente, verifica-se que o perfil das crianças e
adolescentes cadastrados no CNA é destoante quando comparado ao
perfil das crianças pretendidas, fato que reveste a questão como de
grande complexidade”, admite o CNJ no documento Encontros e
Desencontros da Adoção no Brasil: uma análise do Cadastro Nacional
de Adoção, de outubro de 2012.
Criado em abril de
2008, antes mesmo da entrada em vigor da nova legislação sobre o
tema, o CNA tinha como principal objetivo dar mais rapidez e
transparência aos processos. Nos três anos seguintes, foram 3.015
adoções no Brasil, uma média de quase três por dia. Um ritmo que
pode, ainda, estar em queda. De acordo com dados da Seção de
Colocação em Família Substituta da 1ª Vara da Infância e da
Juventude do Distrito Federal, a média mensal de adoções caiu
depois das novas exigências legais. Em 2010, a Justiça autorizou
195 adoções no DF — média mensal de 16,25 casos. Em 2011, foram
menos: 144 no total, ou apenas 12 por mês.
Incompatíveis
A análise dos
perfis do CNA indica que é falsa a crença comum de que o maior
obstáculo às adoções no Brasil é a questão racial. Cerca de um
terço (32,36%) dos pretendentes só aceita crianças brancas, que
representam exatamente três em cada dez das cadastradas. Por esse
viés, portanto, não existiria dificuldades. Até porque quase 100%
das famílias se dispõem a acolher crianças negras ou pardas, que
são duas em cada três do cadastro. Além disso, nada menos que
38,72% se declaram indiferentes em relação à raça do futuro filho
ou filha.
Incompatibilidade
difícil de ser suplantada é, na verdade, o fato de que apenas um em
cada quatro pretendentes (25,63%) admite adotar crianças com quatro
anos ou mais, enquanto apenas 4,1% dos que estão no cadastro do CNJ
à espera de uma família têm menos de 4 anos. Em 13 de março deste
ano, eram apenas 227 em um universo de 5.465. Por isso, cada dia que
passam nos abrigos afasta as crianças ainda mais da chance de
encontrar um novo lar. Tanto que é inferior a 1% o índice de
pessoas prontas a adotar adolescentes (acima de 11 anos), que por sua
vez respondem por dois terços do total de cadastrados pelo CNJ.
Outro fator que
costuma ser sério entrave à saída de crianças e adolescentes das
instituições de acolhimento, de acordo com as estatísticas do CNJ,
é a baixa disposição dos pretendentes (17,51%) para adotar mais de
uma criança ao mesmo tempo, ou para receber irmãos (18,98%). Entre
os aptos à adoção do CNA, 76,87% possuem irmãos e a metade desses
tem irmãos também à espera de uma família na listagem nacional.
Como os juizados de Infância e Adolescência dificilmente decidem
pela separação de irmãos que foram destituídos das famílias
biológicas, as chances de um par (ou número maior) de irmãos achar
um novo lar é muito pequena.
Demora crítica
Para o senador Magno
Malta (PR-ES), a morosidade nos processos de adoção acaba
contribuindo para que vidas sejam desperdiçadas.
“Algumas dessas
crianças vão se prostituir depois dos 12, 13 anos de idade porque
não aguentam mais. Saltam o muro do abrigo, vão para a rua e não
voltam. Dizem que a rua é o lugar delas. Estão roubando e
assaltando, pagando o preço desse tipo de raciocínio de quem tem o
poder e podia facilitar as coisas, mas não faz isso”, lamenta o
senador.
“Adotar é algo
louvável. Mas durante o processo de adoção não pode haver
irregularidades e atos que violem os direitos humanos, não só dos
adotantes como dos adotados”, argumenta o também senador Paulo
Paim (PT-RS), que presidia a Comissão de Direitos Humanos e
Legislação Participativa (CDH) do Senado quando aconteceram os
debates.
As explicações
para o desinteresse dos brasileiros em acolher crianças maiores ou
adolescentes têm origem no fator predominante que leva uma família
a decidir pela adoção.
http://www.senado.gov.br/noticias/Jornal/emdiscussao/adocao/realidade-brasileira-sobre-adocao.aspx
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